“Precisamos, além de esperança, de um plano.” A frase é da cientista e ativista climática Ayana Elizabeth Johnson em entrevista ao podcast The Gray Area, meu favorito. Ela traduz bem a angústia que compartilho com tantos que refletem sobre os impactos das mudanças do clima em todos os aspectos da nossa vida.
Na última semana estive na Conferência Ethos 360º, que aconteceu no Pavilhão da Bienal no Parque Ibirapuera, e teve como tema “Transformando negócios, impactando o mundo”. O evento trouxe reflexões que corroboram a fala de Johnson e que desenvolvo neste texto.
O depois chegou
Vivemos um recorde de queimadas em todo o território nacional, com consequências do Oiapoque ao Chuí. A cada ano temos o verão mais quente, o inverno mais quente, a maior estiagem, os maiores incêndios, as chuvas mais fortes. É tudo superlativo em termos de impactos e não consigo entender o porquê de seguirmos agindo como se nada estivesse acontecendo.
Estamos em uma encruzilhada. O modelo econômico predominante nos últimos 200 anos e intensificado desde a década de 1970, nos trouxe a esse cenário de policrises permanente. Mudanças climáticas, desigualdades galopantes, corrosão da democracia, tensões sociais. Consequências, pensadas ou não, de uma forma de ver o mundo, em que o ser humano se separa da natureza e a explora – e aos seus iguais – sem limites para acumular riquezas. Em que o lucro é fim e mantra. It is not a bug, it is a feature. Mas esse modo de produção nos levou ao esgotamento e precisamos de outro. Estamos em uma mudança de era, no processo de definir como ela será.
A hora de um plano
Quem decide a direção e o ponto de chegada? Essa é uma pergunta que a economista Mariana Mazzucato levanta no livro Missão Economia: um guia inovador para mudar o capitalismo, e à qual responde com os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável – os ODS da ONU. Temos um ponto de chegada, temos um plano, mas nos falta coragem, vontade política e mobilização em torno do que precisa ser feito.
Temos um sistema de incentivos – econômicos e simbólicos – que não está de acordo com o desafio à frente. Como sociedade, seguimos financiando e subsidiando projetos intensivos em emissões de gases de efeito estufa, por exemplo. Não temos estrutura ou investimento suficientes para chegarmos a 100% de saneamento básico, coleta seletiva de lixo e reais políticas públicas que penalizem quem dobra a aposta em um sistema econômico linear e destrutivo.
Integrando as soluções
As soluções existem – de energia limpa, de reciclagem, de produção de bens que não sejam descartáveis, diminuindo a necessidade de matéria-prima bruta, já tão esgotada. Temos modelos de agricultura regenerativa, soluções baseadas na natureza. Estudos das maiores consultorias do mundo apontam um potencial enorme, inclusive econômico-financeiro, em fazer a transição para uma economia de zero carbono.
O nosso problema não é tecnológico, é político e cultural.
Mais do que um novo modo de produção, existe a demanda por um novo paradigma de sucesso e de histórias que sejam capazes de nos localizar no mundo. A dimensão e profundidade dos desafios e o mood apocalíptico tendem a nos paralisar. Apesar do desânimo, é hora de cultivar o sonho, a esperança e de criar outras narrativas de sucesso, de mundo, de vida. E de nos engajarmos em um plano para alcançá-lo.
Isabela Scarioli Líder de estratégia