O poder das boas histórias: storytelling como ferramenta de conexão

“Os cientistas dizem que somos feitos de átomos, mas um passarinho me contou que somos feitos de histórias” 

Eduardo Galeano 

 

Em julho deste ano, um comercial da montadora Volkswagen, em comemoração aos seus 70 anos de história no Brasil, causou um rebuliço nas redes sociais e foi notícia nas principais mídias do país. O principal motivo foi o uso de Inteligência Artificial (IA) para recriar uma das maiores cantoras brasileiras, Elis Regina, que faleceu em 1982. No comercial, a artista fez um dueto da canção “Como Nossos Pais” com sua filha, a também cantora Maria Rita. Chamou a atenção no vídeo a emoção do reencontro entre mãe e filha, concretizando um desejo de parte dos fãs das duas e, servindo como uma ponte entre o passado e o presente. 

Deixando de lado a controvérsia que gerou, queremos abordar a capacidade de mobilização que o filme teve. Ele é um excelente exemplo de uma abordagem única para cativar a audiência: o uso do storytelling. O foco não está na venda de produtos, mas sim em criar conexões emocionais e tocar o público. Independentemente da polêmica relacionada ao uso da IA acompanhar o dueto de Maria Rita e Elis Regina, bem como as vivências entre diferentes gerações mostradas no comercial, emocionou milhares de espectadores brasileiros por envolvê-los em uma jornada emocional e humana, conectada às suas próprias lembranças. 

Ao utilizar o recurso do storytelling na comunicação, seja ela voltada ao público interno ou externo, as empresas dão vida a personagens e conectam o público com histórias que geram identificação e mexem com memórias, sentimentos e referências. Ou seja, a mensagem não é mais transmitida tendo como foco exclusivo informações técnicas ou características de produtos, mas criar um senso de identificação e emoção com a história repassada. 

 

Mas afinal, o que é storytelling? 

Somos seres simbólicos e, assim, significamos o mundo a partir das nossas experiências. Usar as técnicas de storytelling na comunicação significa pensar nas pessoas como elas realmente são: indivíduos com infinitas particularidades e repertórios, e não como números. Para isso, é necessário entender o público, sua história, seus sonhos e suas origens, além das conexões com as marcas. Ou seja, mais do que informar, o papel da comunicação é transformar. Um recurso de storytelling muito comum é a gravação de depoimentos em vídeo, de modo a valorizar histórias individuais conectadas a uma notícia ou um produto, por exemplo. 

A demanda por esse tipo de comunicação nunca foi tão urgente. Em meio a um mundo em que as pessoas se sentem cada vez mais cansadas e ansiosas, além de sobrecarregadas com o volume de informação que recebem diariamente, como fazer com que elas sejam tocadas pelas informações que recebem? O storytelling é uma boa solução. 

Com uma comunicação que dê voz às pessoas e gere identificação, é muito mais provável que os indivíduos prestem atenção, vejam significado e sejam afetadas. Assim, o papel transformador da comunicação se torna o foco, evitando que os acontecimentos somente passem diante dos olhos e não gerem nenhum tipo de impacto. Afinal, os comunicadores têm o papel de entender o outro e criar mecanismos para fazer com que a mensagem que querem passar seja recebida e compreendida da melhor forma possível. 

 

 

As características do storytelling 

Contar uma boa história é um talento que pode ser aprendido! Há algumas técnicas básicas que podem e devem direcionar os esforços. A primeira é usar a voz em primeira pessoa, ou seja, criar mensagens em que os personagens falam com sua própria voz. A mensagem transmitida também deve ser marcada pela vulnerabilidade do personagem e gerar emoção e desejo, como no vídeo acima, focado nos sentimentos da Kombi. Além disso, outra dica é usar a chamada universalidade temática – abordando temas com que qualquer pessoa, de qualquer local, possa se identificar –, bem como o relato lacunar – recurso em que o personagem traz um recorte de sua vida que tenha mais emoção ou seja mais adequado ao tema proposto. 

Um bom storytelling tem uma proposta inspiracional, em que a comunicação é capaz de evidenciar a transformação do personagem. É preciso ainda deixar que o indivíduo fale normalmente – o chamado repertório coloquial – e adotar um tom confessional. As chamadas histórias de primeiras vezes (como o primeiro dia no trabalho ou a primeira casa comprada) também são elementos característicos de uma boa história. 

 

Como não estragar sua história 

Além dessas orientações sobre o que deve ser feito ao usar a técnica, também há algumas dicas do que deve ser evitado. Comunicações protocolares (mensagens formais e padronizadas, que cumprem apenas procedimentos predefinidos) e informações em excesso, por exemplo, mais afastam o público do que o aproximam, então devem ser deixadas de lado. Da mesma forma, narrativas puramente quantitativas e que não consideram as diversidades, emoções e subjetividades dos indivíduos também não fazem parte do storytelling. 

A capacidade de contar histórias e construir diferentes narrativas é uma característica de um bom jornalista e comunicador. Mas isso só pode ser feito de forma eficiente sob o olhar do outro, a partir da escuta e ao ampliar a voz dos indivíduos que formam a mensagem a ser transmitida. Com o storytelling, é preciso mais contar do que informar – assim, poderemos impactar e transformar o outro a partir de histórias únicas, capazes de despertar a atenção, mexer com as emoções e gerar identificação. 

 

 

Mateus Calazans
Coordenador

 

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